sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

A MÃO DE DEUS


 

Como uma árvore grande, a mão de Deus se estende sobre a terra enquanto nós caminhamos na cegueira característica dos pequenos seres desprovidos de asas. A calma da manhã avança sobre o mundo de sotaques e os nosso ouvidos moucos não nos servem para nada. Há em cada momento da luz uma embriagues  aos nosso olhos e jamais voltaremos a experienciar tamanha emoção. Somos gordos em nossa empáfia! Dormimos com os pombos e acordamos com os porcos, é inútil esperar pelas promessas da manhã enquanto  o coração pesado faz curvar nossas vértebras a cada passo dado. Ninguém jamais calou a boca da noite ou os olhos da manhã, mas todos nós  já nos esquecemos das nossas mãos, muitas vezes  sujas de barro - e nos esquecemos até mesmo a origem do próprio nome. E não somos mais que crianças perdidas no embalo do vento fugindo de um calado e antigo fantasma.



imagem: Araucárias

aquarela s/ papel Canson






quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

ENCÁUSTICA

 


O teu olhar é pedra de fogo. Derrete a cera e escorre vernizes sobre as pálpebras da noite. Verte o amor dos poros da pele e recobre a história e a hóstia nos lábios pagãos. O teu olhar de fogo é pedra luminescente arreando a fera que me habita e caminha sobre o teu corpo no estertor da noite alvissareira. Fosse para mim a felicidade fresca e madura, a colheita de cada dia -, eu me deixava levar nesta seara de dores que antecede a promissão. E navegando entre as cores, arrebóis insondáveis da tua alma, seria eu, o reverso do silêncio e a paz aprazível que lhe beija as mãos?! Todavia, a voz e as palavras se desdobram em ecos de resoluções sem que eu possa mover os lábios. A noite chega estranha em sua dormência sob as rudes carícias das velhas cartas guardadas dentro de um livro e o teu olhar de pedra de fogo, alumia os meus sonhos através de paisagens desconhecidas. Ordenadamente o tempo vai empilhando as lembranças dando uma trégua ao coração sonoro. Não fosse tão doloroso viver, eu me diria feliz.



imagem:  Sonhos / Série Emarginatus

Marcelo Tanaka - @marcelo tanaka


segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

VOCAÇÃO

 




O meu mundo é estranho de silêncios e a chuva que chega de repente me aceita como irmã. Alimenta as minhas raízes e lava as moedas que tenho nas mãos. Quisera compreender o mistério dessas águas e o seu dulcíssimo sabor de vida, porque nada é concreto e o poema que eu escrevo na areia, fala a língua das águas, contudo, não fala a língua dos homens. Há uma penitência infinita que tropeça no meu caminho me obrigando a mudar a direção dos meus passos. Cedo ou tarde vou lançar ao mar as minhas sete moedas e com isto, o presente será o futuro e o passado apenas uma ressonância. Tomo as rédeas da minha existência e me transformo em luz.



imagem: Voo

aquarela s/ papel Canson

Luciah Lopez


domingo, 9 de janeiro de 2022

ME CONVIDA PARA DANÇAR...




ressuscita-me desse absurdo de horas perdidas em constantes caminhadas pelos becos da memória onde não se acha ninguém ___________ até mesmo a sombra desgrudou, isso acontece, né? mas eu vou sacudir o corpo numa janela como é costume fazer com as toalhas cheias de migalhas de pão após o café... doravante serei um cérebro serei surpreendida num voo sem asas [não preciso de asas] basta um fechar de olhos e o retrato que está sobre a mesa me convida para dançar...  

Who cares if one more light goes out? In The sky of a milion stars...

incontáveis galáxias dentro dos meus olhos acendem suas estrelas e os cometas cortam os sete céusnada mais a fazer, o pássaro é livre - a imensidão cabe dentro do meu peito.


imagem: Sinapses

colagem sobre papel

Luciah Lopez

domingo, 2 de janeiro de 2022

UM OLHAR NA SOLEIRA DO MUNDO


 Passaram-se vários anos antes que eu descobrisse aminha relação com o universo, tudo o que eu via era diverso do meu espírito. O mundo se replicava aos meus olhos sem que eu fizesse parte de nenhum fragmento que por ventura pudesse enxergar. Tudo era uma crescente negativa - e tudo me importunava obrigando-me a uma constante solidão. Uma ferida invisível era o escudo e em meio à tarde, eu era  a noite. Experimentei o significado da inexistência, o que acabou por deter-me à flor de mim mesma. Compreendes? Compreendes a dor de uma criatura que não pertence a lugar nenhum?! Fecho os meus olhos e a sinuosidade luminosa estabelece contato - nada mais me fala de quaisquer tristezas que provenham de impressões mal explicadas. Novamente  eu vejo a luz. Novamente eu sou a luz e o desenho da vida é refletivo. Singularmente colorido e quente e me atrai o olhar sobre a soleira do mundo. A tais impulsos me entreguei e aquilo que a minha curiosidade buscava passou a fazer parte da minha alma primitiva, inspirando-me os sonhos me aproxima da paixão por estar viva, livre e poder amar.


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foto: LL