quinta-feira, 31 de maio de 2018

CONSIDERAÇÕES


Considerações

Pouco tempo antes da minha salvação eu era os olhos do mundo e dos demais discípulos à minha volta. Aos olhos de todos, uma tarja de luto flamejante e um cálice de água benta. O velho ancião, cujo semblante suscitava melancolia, acendia os relâmpagos riscando o céu despido de estrelas. Ninguém podia sonhar. Ninguém podia sorrir. Os disfarces, as máscaras eram feitas de pesado metal retirado do útero da terra e cobriam a vergonha de todos. Não havia esperança. Uma singularíssima tristeza recaída sobre as crianças, impedia as orações e os folguedos. As sementes secavam amontoadas pelos quatro cantos sem a possibilidade germinar, impediam a rosa de exalar seu perfume. Os poetas calaram a poesia e o mundo silenciou. O sangue não era vermelho, as veias se prendiam em imensos teares na trama e urdidura dos ossos e o constrangimento dos antepassados era semelhante ao do pássaro que não pôde alçar voo. Uma pedra rolou montanha abaixo abrindo uma ferida por onde enxofre e lava causticante fizeram um rio. Caim dançou a morte e a redenção, e pássaro azul voou através daquele céu plúmbeo indo pousar no meu coração. Estava consumado.


ÚLTIMO POEMA DE MAIO



Quando a noite deita seu véu sobre a terra
meu coração se cala.

Mi'alma se cala, emudece e eu penso: porquê o meu amado não está ao meu lado, se o amor se faz presente em nós?
Tristeza maior não existe, que a ausência dos beijos teus
mesmo sentindo o teu amor a me envolver nas horas da tarde em suspiros e doces ais, meu coração clama, meu corpo reclama, mi'alma padece...

...ah, meu amor adorado, meu anjo de luz resplandescente, tua imagem, dos meus olhos não desvanece, e as tuas águas de flores brancas em cachoeiras amenizam a saudade da tua essência.

Último dia de maio...

Três estações se passaram e o meu amor e seu, seguem juntos. Fomos um no outro ungidos com óleo e bálsamo e as nossas silhuetas ficaram impressas no linho branco que recobre o Tempo.

Faz o caminho da nossa saudade, e lê estes versos suplica mi'alma
repousada em dor silente_____sempre a tua espera
pois o amor é dádiva da vida e não da morte.

Ultimo dia de maio e o teu ciclo se fecha dentro do meu. 


Para LAM




imagem Faisal Iskandar


terça-feira, 29 de maio de 2018

CÂNTICO DO PURO AMOR


CÂNTICO DO PURO AMOR

Caminhei sobre as folhas secas de outono, tingidas de sangue e ouro. Minhas vestes, em trapos se tornaram expondo a nudez da pele, os meus cabelos desgrenhados, as minhas mãos crispadas faziam sangrar o relicário acordando a sua imagem. Eu era a dor. Eu era a consistência da dor. Nem mesmo as aves noturnas, fugitivas do umbral e presas em teias pegajosas, eram minhas companheiras. Era a dor. A mais angustiante dor desfazendo os sonhos e a vontade de viver. A salmoura corria nas minhas veias e a planura dos meus ossos doía-me na urgência da lava fervente. Não havia horizonte aos meus olhos, porque não estava o meu amor ao meu lado. O negrume dessa noite recai sobre o coração dos homens, reparte amor, em tristeza e solidão. Há quem pense serem fantasmas, que, acorrentados à consciência da carne maldizem o amor, transformando açúcar em sal, ouro em pedras sem valor. Alimentam o monstro que os consome diuturnamente e reinventam um céu sem estrelas...

Era o sexcentésimo septuagésimo sexto dia!
O meu olhar finalmente encontrou o espelho dos seus olhos
Morri e perdi a conta de quantas vezes renasci
Menina
Mulher
Sacerdotisa do seu amor
Amante do seu corpo
Mulher
Menina
Nos seus sonhos.
Naquele momento
Na ansiedade suarenta das mãos
Que se reconhecem ao primeiro toque
Não existe passado
Não existe futuro
Existe a procura
A sede
O sonho
A vida
O amor
A fome
O desejo
E o beijo se derrama liquefeito
De afogamentos em ondas convulsivas
Em nossos lábios náufragos.


... um céu sem estrelas é manto de veludo jogados aos pés da santa, é mortalha do Sagrado Coração pendurado na parede que acende o medo nos seus olhos de menino...

Era o meio do dia!
“Dê-me as suas as suas mãos
As minhas são suas”
Passos e caminhos
Pedras gastas
Calor
Ruas
Carros
Praças
Casas
Portas
Escadas
Porta
O mundo girando a sua presença
Feito um anjo em carrossel
O meu paraíso
O meu pecado
O dorso
O reverso
O côncavo
A fonte
A dádiva
A fêmea
O Macho
Alfa e Omega
A pedra
O sacrifício
A dor
O prazer
A vida
O amor

... nas águas de um rio batizei os meus pés-, deixei para trás todas as mulheres que eu fui, todas as mágoas, todas as lágrimas e renasci criatura ante o criador. Recitei um salmo, colhi uma flor, comi uma fruta, beijei suas mãos, afaguei seus cabelos, respirei o seu sono, me aqueci no seu corpo adormeci em você pra nunca mais acordar em mim...

“Será que isso é amor? Um puro amor, uma quase maré?”

... uma praça, uma igreja, poesia de boca em boca ____ sua boca e a minha seu olhar e o meu____um pedaço de pão, um gole de café, sua risada e um beijo gelado de sorvete. Uma foto na janela, uma cerveja outro beijo, uma subida e uma descida, um cigarro e um descanso, seus pés descalços, seu corpo nu, cicatrizes, maciez, ternura, sua boca, seus dedos, um papel, um livro, uma foto. Uma janela de vidro, um rio e suas lembranças... uma libélula pousa na minha mão____ isso é amor sem ter começo e nem fim. Somos dois, somos um e o tempo brincando ao redor daquele menino...

Só um menino...
Só um menino/amor





para LAM



quinta-feira, 24 de maio de 2018

CORAÇÃO DE PÁSSARO


Naquela tarde o pássaro pousou com suavidade e ardência. E todos os detalhes mais precisos e preciosos foram inseridos no vermelho da carne. Quanto mais contemplava, mais a esfera girava e quanto a mim, não sentia a necessidade de explicar nada a não ser me abandonar naquela dança e sentir a minha transformação interior. O início das cores, o fundo azul de todos os sonhos, era mais que um escudo de tonalidades fortes e o pássaro a me guiar por entre as nuvens e a exatidão das pernas - o rio, as águas, as corredeiras tormentosas  e a esfera, a cabeça de todos os sentidos pousada às margens dos meus lábios, ressuscita! Não há limites no coração do pássaro e nunca haverá, porque a plenitude do voo foi sentido em cada terminação nervosa da pele que me reveste.

para Odur


imagem: Miró

quarta-feira, 23 de maio de 2018

TRAMAS & NÓS


Em mim ficou o que a vida resume: antigas coreografias, tramas e urdiduras, a inconstância dos fios da seda, a dissimulada carícia do vento soprando os meus cabelos. O cheiro adocicado da pipoca caramelada, o rodopio do pião, o requebrado da mula-manca, os desenhos de giz  nos muros  e paredes. A câmara secreta, a casinha na árvore, a maquininha de costura, as bonecas peladas, a chita florida e as muitas histórias. O olhar interrogativo, o lábio mordido, o nariz empinado. O braço engessado, o grito e a risada. A mordida e o beijo. A cobra e a salamandra. O verde e o azul. A palavra. A palavra. A palavra. O meu tempo não tem barreiras, eu voo longe da Terra  e desenho o mundo numa trama de fios e nós e amarro o coração viajante no olho do furacão.

foto:LL




ALICE E AS ESTAÇÕES


De todos os dias, houve um que foi mais branco que todos. Um dia de ausências, idas e vindas ralando a pele abrindo feridas, expondo a planura dos ossos. Foi um dia tenso e tudo findou em negrume desmantelo da alma. Coisa mais que estranha - doidice até! A tia velha caminhando pra lá e pra cá, no peito a medalha sagrada de São Bento e nas mãos, a bacia esmaltada com desenhos em azul e branco, igual  louça portuguesa  contém o macerado de folhas de ora-pro-nóbis com sal,  alho e  cebola. De longe, Alice observa  o silêncio  feito de escamas, e a grande cobra d'água aquece o corpo enroscada aos seus pés, sibilando vez ou outra -, coisas que só Alice pode ouvir e entender. O que era um segredo na boca daquela velha senhora, já não faz sentido pois até mesmo os pássaros abandonam velhos ninhos feitos de cabelos brancos. O tempo passou e a velha senhora se perdeu entre a amargura e os rabiscos de anzóis e facas. Quer renascer na sedução fervendo tomilho, manjericão e tília, mas o pote de todos os sonhos não pertence a ninguém, não sacia a sede do umbigo, muito menos paixões irremediáveis. Alice se põe a caminho e numa última olhada por sobre ombro, pensa: não vale a pena! rsrsrs



imagem: Avery Palmer

terça-feira, 22 de maio de 2018

DHIOGO JOSÉ CAETANO ENTREVISTA LUCIAH LOPEZ



Dhiogo José Caetano
dhiogocaetano@hotmail.com

Opinando e Transformando
Luciah Lopez é a 17ª entrevistada na série sobre cultura
Objetivo é formar um mosaico com o que cada um pensa desse universo multifacetado

Pelo Brasil  –  25/07/2016 20:14

“A cultura é reformatória e pode sim libertar, desde que se tenha o cuidado com os excessos”

> Clique e confira todas as entrevistas da série sobre Cultura "Opinando e Transformando"

A 17ª convidada na série de entrevistas “Opinando e Transformando” é Luciah Lopez. Uma oportunidade para os internautas conhecerem um pouco mais sobre os profissionais que, de alguma forma, vivem para a arte/cultura. Confira:

> Nome: Luciah Lopez
> Reside: Campina Grande do Sul (Paraná) 

> Breve currículo: Acadêmica de letras, Prêmio Cataratas de Poesia, participa do Recanto das Letras e outros sites de poesia, amante das artes em geral. 

> Em sua opinião, o que é cultura?

É a mola mestra de uma sociedade que tem como objetivo o aprimoramento dos indivíduos qualificando-os de acordo com suas escolhas e aptidões pessoais. A cultura é instrumento transformador desde o surgimento do homem, isto é claramente constatado nas pinturas rupestres e em outras manifestações da arte primitiva. A cultura sempre foi o “norte” em todas as civilizações e permanece assim.

> Você se considera um difusor cultural? Qual é o seu papel neste vasto campo da transformação mental, intelectual e filosófica?

Sim. A partir do momento que eu me inseri neste ambiente poético, digamos assim, passei atuar como um difusor cultural. Ao participar a minha arte em sites específicos para poesias é estabelecido o contato com o leitor que absorve as informações ali contidas e pode, perfeitamente, utilizar como elemento reflexivo - não digo, mudando seus conceitos, mas aprimorando-os.

> Como você descreve o processo de aculturação, ao longo da formação da sociedade brasileira?

Estamos no Brasil e tudo que acontece “lá fora” reflete imediatamente na cultura brasileira que absorve e transforma a informação de acordo com o que tem ao alcance das mãos. Vejo com certo temor a perda das nossas raízes culturais em função desta invasão de informações “americanizadas”.

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"Acredito que se tenha que inventariar os nossos elementos de raiz folclóricos para resguardá-los, até mesmo para que as futuras gerações não se percam no meio desta avalanche transformadora".

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> A cultura liberta ou aprisiona os indivíduos?

A cultura é reformatória e pode sim libertar, desde que se tenha o cuidado com os excessos. A pressa com que se celebra a melhoria de uma sociedade pode também levá-la à falência.

> Que problemática você destaca na prática da difusão cultural?

Somos um país jovem, e temos potencial expressivo, no entanto, o descuido com a educação é gritante. Existe falta de educadores capacitados nas regiões afastadas dos grandes polos culturais. A despeito de salários adequados, os profissionais qualificados buscam as metrópoles desprezando outras áreas e levando milhares de jovens ao analfabetismo funcional.

> Comente sobre o espaço digital, destacando sua importância no cenário cultural brasileiro e mundial?

Abraçamos o mundo através deste espaço digital. A familiarização com a era digital é impressionante, a rapidez com é incorporada no contexto cultural brasileiro nos coloca praticamente no primeiro mundo! (risos)

> Qual mensagem você deixa para todos os fazedores culturais?

Que continuem fazendo sua arte, seja ela qual for e sempre buscando conhecimento para torná-la cada vez melhor porque todo aquele que nasce com um dom qualquer, seja para a poesia, música, pintura e outros segmentos da arte não pode e nem deve guardar para si o seu trabalho, mas somar outros fazedores de arte para que possamos cada vez mais fortes abraçar o mundo com nosso trabalho, como nossa emoção.


http://www.olhovivoca.com.br/pelo-brasil/5008/luciah-lopez-e-a-17-entrevistada-na-serie-sobre-cultura/


LUIZ ALBERTO MACHADO ENTREVISTA LUCIAH LOPEZ

LUCIAH LOPEZ EM VERSOS & ENTREVISTA


LUCIAH LOPEZ – (Fotos do acervo de Luciah Lopez) Primeiro ela foi destacada no meu blog Varejo Sortido, contemplado alguns dos seus poemas, em 2011. No mesmo ano, selecionei alguns dos seus ótimos poemas eróticos e os fiz publicar no meu blog Crônica de Amor Por Ela. Em 2014, ela foi inserida como homenageada na Campanha Todo dia é dia da mulher. Agora faço um novo destaque da dimensão literária dessa admirável escritora paranaense que se diz amadora. Primeiro vamos pros versos:


ESCURIDÃO

eu não tenho medo do vento
nem das noites de escuridão medonha
onde nada mais se vê,
e nem se ouve

em noites assim
só o tilintar das moedas e o andar abafado
_arrastado andar de sacristão embriagado
pelo vinho e pelos olhos de fogo

...olhos acesos nas noites de longos tempos

((teiniaguá))

a pedra de sol - brilha
libertando o amor
e fazendo prisioneiro - o Tempo - em carrossel
de vinho e estrelas cadentes

e o que era belo
fica triste e o verde
adormece as cores do dia
despertam a noite

andarilha através dos tempos

PAIXÃO

Essa hora de azul céu
é um convite ((antes que seja tarde))
________ao amor jogado ao léu...
E quem resiste? Se nas veias o sangue arde?!

Vem! Se entrega a esse abandono
na rede, na relva, no tapete ((tudo inspira))
dias assim _______ amor em final de inverno
aquece ((feito um vinho)) que a alma transpira!

A boca tesa se oferece
ao beijo____________ a hora é propícia!
Fecha os olhos e o mundo desaparece

Tudo é paixão, intenso tesão
o desejo arde em ousadas carícias
e os amantes___________rolam pelo chão!

MACABEA

Arrê!... Estrela que acende azul
alumiando a vastidão que acredita
no sopro do vento.
Desse vento que roda o mundo
girando obediente à rosa dos ventos.
Entre os rabiscos
da virgem que tece rendas - as vagas lembranças do navio
carregado de sonhos e o cheiro das goiabas maduras...
A paixão é a fantasia
é a diva - a estrela maior!
Mas quando chega o poente e atropela
as letras, lembra-se que é medíocre
e os erros saltam as palavras - semântica/ticaseman
léxico/lé_xi_co [xicolé/colixé/loxicé - formiga lava-pé]
A noite vem desembocar aqui
e o cisco cai do olho sem ser soprado...
...hoje é a noite da minha noite!

EU TE AMO

Eu te digo: “Eu te amo”
nas horas mais impróprias
Nos momentos mais loucos
Quando o tempo se deita
encobrindo a barra da tarde...
Eu te amo em cada sopro do vento
Que me canta a tua voz,
Em cada flor que se abre
Nos seus lábios/amor
Em cada estrela que acende
Nos teu olhar
Em cada gota de orvalho
Nas tuas mãos/conchas d’água
para matar minha sede.
Eu te amo além, muito além dos limites
Da vida e da morte
Da razão e da loucura.
Além dos planos e dos anseios
Além de toda dor e toda lágrima
Eu te amo, porquê você é parte minha
Corre em minha existência
Sangue/fel/mel da tua boca que me alimenta
Enquanto te espero no vão do tempo
Pois o amor não morre – [fortifica-se!]
E calado se dá, numa entrega total.
Eu te amo e você vive.
Eu te amo e eu vivo.

PLENILÚNIO

Ouço a sua alma
Dentro de um pensamento
Nas carícias de um vento sem nome
Que me acolhe num abraço
Que até minh’alma se sente afagada.

Plenilúnio!...

O manto azul se rasga de cima abaixo
Parindo a lua dos seus olhos
Suspensos no meu olhar...
A esperança é sublime dançarina
Desfolhando-se entre as palmeiras
No claro escuro dos sonhos ainda por sonhar...

Os dias já não são iguais – o outono
Veste as tardes de folhas vermelhas
E o vento auspicioso
Canta em meus ouvidos – e a sua voz
Sussurrante
Beija meus lábios em versos carregados
De estrelas cadentes...

TEMPO MINGUANTE

A olhar pela janela
a mulher vê o tempo afastando-se.
Não sabe se chora não sabe se ri.

Calada em suas lembranças
aninhando-se em sonhos
não fala nem grita.

O tempo sorrateiro se afasta.

A mulher na janela, envelhece.

SORVETE COM CALDA DE WHISKY

As horas morrem nos ponteiros do relógio
Enquanto Esopo cria fábulas
As uvas ainda estão verdes
E os carneiros saltam sobre as cercas...
Os ponteiros dançam ao som de Straus
E você, deixa os pés de molho em água fria?!
São tantos ocasos e lunações
Que as marés já sentem enjoos.
E a chuva não vem mais,
Pegou carona no vento sul...
Talvez eu ouça Prince mais tarde
E tome sorvete com calda de whisky
Talvez o tempo acenda as luzes da ribalta
E tudo volte a fazer sentido
Como numa tabela de cores
Ainda assim, eu vou ficar aqui mais um pouco
Porquê a mediada que a sombra caminha
Eu arrasto o meu banquinho – rsrs
e o arco do céu faz sombra aos meus olhos
Então eu posso contar as marés...

CÚMPLICE

Voluptuoso é o céu da tua boca
que faz germinar a Via Láctea na vertente das minhas coxas
deixando o corpo exangue
__________no delírio suspenso de cada gozo!
E nos lençóis amarrotados, o perfume de jasmim
cúmplice
inebria os sentidos
e faz arder a pele
que mostra agora, o que eu não pude ser
ou fazer na noite escura do teu prazer.

INVERNAIS

_________apontou-me com o dedo
o que me bastava saber
então, pude mover os lábios e beber
da água cristalina
que escorria sobre as folhas verdes

o Tempo, este repousava com os olhos embaciados
recusando-se a olhar-me...

contemplei o Silêncio!
era repleto de sons e o mundo pareceu-me um
anelado mar sem fim,
inteiro de sensações navegando para dentro dos meus olhos
que não tinham paragens e nem signos ( ! )

ressoavam as dores do firmamento
num parto seco e palpitante de singularidades
e a Esperança, sorriu___________ destemida, levantou
a mão e fez o sinal...

o firmamento, tornou-se visível e claro
e límpido e mais uma vez  o inverno das brancuras
achegou-se__________e sem alterar as cores
eu pintei aquilo que os meus olhos
transformaram em poesia.

HAIKAI 97

na folha seca
as mãos do tempo

borda crivos


ENTREVISTA – Agora, vamos conhecer um pouco mais dessa escritora que edita os blogs Palavras de vidro: toda palavra nua, é branca reunindo o seu acervo poético, o Algodão doce e poesia com seus trabalhos para o público infantil, o Orvalho reunindo seus haicais, o Palavras no papel: crônicas, contos e prosas e o saborosíssimo e tentador Arquétipo, reunindo seus textos eróticos. Ela também reúne seus trabalhos literários no Recanto das Letras. Agora, pra vocês, Luciah Lopez.

LAM - Luciah, vamos pra pergunta de praxe: quando e como se deu seu encontro com a Literatura?

Foi através do meu pai. Quando eu era criança, era bastante comum, as pessoas receber em casa os representantes das editoras vendendo livros de romances e as famosas enciclopédias. Quem não teve uma Enciclopédia Barsa, por exemplo?! E aos oito anos de idade ganhei o meu primeiro livro e foi através de José Mauro de Vasconcelos que eu fui apresentada a Literatura.

LAM - Quais as influências da infância e adolescência que lhe marcaram na definição da militância pela área literária?

Depois de todos os livros de Machado de Assis, vieram os poetas parnasianos e na sequência, descubro nas prateleiras da biblioteca do colégio onde eu estudava a obra completa de Clarice Lispector, Florbella Espanca, Almeida Garret e muitos outros poetas da atualidade. Um pouco mais tarde, com a Geração Mimeografo, tive contato com a poesia emergente nos anos 70/80. Paulo Leminski, Torquato Neto, Bernardo Vilhena e outros. A partir deste encontro, senti que escrever seria não só um objetivo na minha vida, e, sim, o maior prazer em viver uma vida ligada à poesia.

LAM - Que autores marcaram na sua formação e conduziram na rede de influências o seu trabalho literário?

Clarice Lispector sem sombra de dúvidas me abriu as portas da poesia e por ela entram Helena Kolody com os seus haikais, Leminski com a sua irreverência poética e  Cora Coralina com suavidade e doçura.

LAM - Você edita desde 2008, o blog Palavras de vidro. Quais os propósitos desse espaço na rede?

Em 2008 quando resolvi romper a barreira da timidez e postar no Recanto das Letras, tive uma boa aceitação e isso me motivou a criar o Blog Palavra de Vidro, que mesmo sem uma divulgação adequada tem muitos acessos do Brasil e do exterior. Isso de certa forma é bom, porque eu ainda não tenho um livro publicado e assim, a minha poesia não fica restrita só aos de sites específicos. Os Blogs tem um alcance mais amplo e Palavras de Vidro me dá essa alegria.

LAM - Você também edita desde 2008 o blog Orvalho, publicando seus haicais. O que levou você a trabalhar esse gênero poético?

Penso que seja não somente a estrutura do haikai, mas a presença do kigo dá ao “poema” um lugar de destaque. No Brasil, Afrânio Peixoto percebeu o haikai “quase como uma versão” das nossas Quadras, mas ainda mantendo o formato original. Ganhei o livro de Fany Luíza Dupré – “Pétalas ao Vento - Haikais” me apaixonei. E no Recanto das Letras, conheci Luciano Almeida que escrevia haikais de uma forma leve e até bem humorada e tivemos muitas conversas sobre o tema e muitas leituras de Helena Kolody, Guilherme de Almeida e Paulo Leminski e surgiu a ideia de criar um Blog especifico para haikai – Orvalho.

LAM - Há o blog Palavras no papel, que você edita desde 2011. Fala a respeito desse espaço.

Palavras no Papel é uma experiência no campo dos textos mais longos e mais elaborados, os Contos, Causos do Cotidiano e as Prosas. O imaginário do povo simples deste nosso país, é uma fonte inesgotável de histórias e causos que merecem um lugar. Personagens folclóricos fazem parte da minha historia vivida no interior do Paraná e pretendo fazer estes relatos no Blog Palavras no Papel.

LAM - Qual o propósito do Algodão Doce & Poesia, que você mantém desde 2012?

As poesias para crianças de pouca idade surgiram naturalmente nas minhas brincadeiras com minha sobrinha Daniela e depois com meu filho Bruno. Sempre gostei e tive uma facilidade em “explicar” algumas coisas para as crianças e através da poesia consigo uma cadência e uma sonoridade que é bem aceita. E pensando nas crianças idealizei o Blog Algodão Doce e Poesia.

LAM - Há também o belíssimo e envolvente Arquétipo, no qual você traz uma inscrição do Carl Gustav Jung e o mantém 2011. Qual a sua percepção a respeito da psicanálise junguiana com o ótimo conteúdo deste blog?

Arquétipo surgiu da necessidade de mostrar uma poesia mais crua. As mulheres carregaram por anos todos os tabus que foram incutidos por uma educação não digo machista, porque eu tive uma educação bastante liberal para a época, mas os tabus estavam lá. E eu ouvia nas conversas veladas, que mulher não goza, finge. Que mulher não demonstra seus instintos, que 'cio' é para os bichos, que ninguém ler Adelaide Carraro, mas, todas sabiam do enredo e essas informações ficaram latentes até eu começar a escrever de forma a valorizar o erótico, o lado sensual da mulher que deseja e sabe que pode desejar, e eu passei a receber comentários até mesmo ofensivos por parte de pseudopoetas, homens e mulheres, dizendo que aquilo era pornografia e não poesia. Entendi o arquétipo do ser humano a partir desses comentários e Jung deixa claro em sua definição de que o primeiro modelo é o que fica. Para muitos, os tabus ainda são a base de uma existência conflitante, para mim, o modelo é o que deve e pode ser mudado. No Blog Arquétipo procuro usar imagens que revelam a sensualidade e a sintonia dos versos.

LAM - Como você tem percebido a Literatura na atualidade? Que nomes você destacaria?

Eu vejo com bastante entusiasmo o grande desenvolvimento da Literatura no contexto brasileiro e mesmo sem muito incentivo para a poesia, esta, tem uma produção notável. E a transformação no mercado, faz com que novos autores surjam a cada dia. A diversidade da cultura brasileira é muito rica e temos grandes nomes que eu poderia citar aqui: Lúcio Autran, Pedro Gabriel, Maria Helena Sleutjes, Katleen Lessa,Renato Baptista da Luz, Vanice Zimerman, Osmarosman Aedo e tantos outros amigos que fica impossivel citar a todos e que estão dando novos horizontes à poesia aqui no Paraná.

LAM - Quais os projetos que você tem por perspectiva de realizar?

Minha prioridade para 2016 é lançar o meu primeiro livro de poesias. Pretendo fazer um livro bem estruturado e com poesias e alguns kaikais. E enquanto isso não acontece, eu permaneço postando nos blogs e sites contando sempre com a gentileza de amigos como você, levanta a bandeira da poesia e das artes. A você Luiz Alberto Machado, meu muito obrigada, meu carinho e admiração por você é imenso.



http://blogagenda.blogspot.com.br/2015/12/luciah-lopez-em-versos-entrevista.html



quinta-feira, 17 de maio de 2018

DE TUDO QUE SOMOS E O QUE FAZEMOS


Entedia-me perfeitamente com tempo. Então ele chegou, com seu riso de sol e um olhar de menino, trazia nas mãos a lava quente dos vulcões. Juntos deciframos o código da pele e dos sabores, das carícias e dos suores, nos cheiramos feito bichos no cio sem a interrogação do pensamento - somos um dentro do outro permanecendo assim a despeito das circunstâncias porque o Amor não se mede, não se 'vende' e tampouco se compra. 




terça-feira, 15 de maio de 2018

A Santa Deusa de Cada Dia


A Santa Deusa Nossa de Cada Dia

Uma toalha de renda sobre a mesa tosca e as mãos daquela mulher pacientemente trabalhando o papel e criando as rosas marmorizadas.  Os raios de sol bordavam crivos pelo chão acendendo pequenos vaga-lumes na poeira da tarde. Seria uma ousadia qualquer palavra dita -, qualquer som que pudesse romper a magia daquele momento. Então me calei. Haveria tempo para as palavras, mas não o tempo da comunhão. Guardar aquela imagem era o mais certo a fazer, e até mesmo o velho carrilhão se recusava a anunciar as horas. Ela estava linda em sua ocupação de enfeitar o mundo com as suas rosas. Como eu queria participar daquela liturgia - ela era a santa, a mulher, a origem, a deusa - ela era a mãe. E o meu olhar a perscrutar-lhe o semblante, reconhecia a semelhança, assim como a argila reconhece o oleiro. Naquele instante eu percebi que possuía o maior mundo e até mesmo nas batidas do meu coração aceleraram quando ela se virou para mim e disse sorrindo: Oi filha, veio ajudar a mamãe?! Eu sei fazer rosas de papel, mas não sei fazer o tempo voltar e isso é com certeza, uma das maiores, senão a maior saudade que eu já senti - da minha mãe.


para minha mãe Dª. Ira 


domingo, 6 de maio de 2018

A mulher e o Prazer de Ser Mulher


A mulher e o Prazer de Ser Mulher 

imagem: Andy Warhol - Birth of Venus -1984

Ao ler ‘Os Estatutos do Homem’ do poeta Thiago de Mello, percebi a abrangência do poema e como ele nos posicionar dentro deste universo que mantém vivos-, os preconceitos arcaicos que só fazem dilapidar a referida obra poética. É lamentável, que nos dias atuais existam indivíduos não capazes de compreender a diferença entre gênero e espécie da palavra homem dentro do contexto. Penso, que, baseados nesta pequena confusão, estes indivíduos reúnam aspectos totalmente primitivos assumindo uma posição bastante controversa em relação à mulher e o seu papel na sociedade atual. Coube à mulher, ao longo da história da humanidade uma participação irrelevante, mesmo algumas se sobressaindo, outras eram imediatamente caladas e assim sucessivamente até que aconteceu essa explosão de informações que libertou a mulher definitivamente, não numa conquista individual, mas dando a ela o empoderamento coletivo, atitude esta que fez da mulher uma das peças fundamentais tanto na grande engrenagem chamada Vida, como no imensurável poema citado: “Artigo IX   - Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal de seu suor. Mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura.” A ternura que é peculiar à mulher e tão necessária na atitude do homem.




terça-feira, 1 de maio de 2018