quinta-feira, 14 de abril de 2016

A CASINHA É MINHA!



A Casinha é Minha!
 

Era sempre assim que tudo terminava: "A casinha é minha!"-, e o pau comia. Isso nas tardes quentes de 1967 em Paranavaí, eu, Bete, Roseli, Lurdinha, Rosane e Nanai brincávamos de 'casinha' no quintal da minha casa. Nós estudávamos no Grupo Escolar Três Marias num horário muito favorável, das 11h às 14 h, portanto, o fervo começava assim que o uniforme era trocado por um shortinho, uma camiseta e um tênis Conga com biqueira de borracha branca. Eu sempre usava camiseta com estampa de um dos anões da Branca de Neve e o tênis era sempre vermelho.O quintal da minha casa mais parecia o Sitio do Pica Pau Amarelo, tinha muitas árvores - goiabeiras, cajueiro, mangueiras e a mais importante de todas - o abacateiro! E isso sem falar nas flores que a minha irmã plantava em todo lugar, até mesmo na horta que Suzana teimava em manter organizada e protegida dos meus cachorros , galinhas, patos, coelhos, porquinhos da índia e de um ou noutro leitãozinho rejeitado pela mãe e trazido para mim, lá da fazenda e tratado na mamadeira, pra depois eu fazer o maior berreiro quando o meu pai resolvia leva-lo de volta. Aquilo era o paraíso para as nossas aventuras. Mas o que nós mais gostávamos, era de juntar as panelinhas e fazer comidinha usando as verduras da horta. Tudo corria as mil maravilhas, até que por qualquer razão ainda desconhecida, eu armava uma briga, sempre com a Roseli. Era sagrado - todo dia pra finalizar a coisa, eu encrencava com ela. Como a 'casinha' era no meu quintal, é claro que eu tinha que ser a 'mamãe', senão, eu não brincava e pronto. Elas já sabendo da regra, aceitavam. Nós tínhamos a mesma idade, variando apenas no tamanho e eu era a mais alta e isso sempre fez a diferença. Pois bem, lá pelas tantas, eu já de saco cheio da brincadeira de comidinhas e bonecas, armava de colocar a filhas de castigo e a Roseli sempre reclamava. Era a deixa que eu precisava pra ir até o pessegueiro, quebrar um galho fino e mandar ver nas pernas dela. Era só grito e choro e a mãe dela aparecia na janela e gritava chamando pelos filhos: Roseli, Rosane e Roberto, já pra casa! A irmã e o irmão dela, eram menores e portanto brincavam em outro quintal com as crianças menores, irmãos da Bete e da Márcia - eu era a caçula na minha família. Bom, a brincadeira acabava sempre do mesmo jeito - Roseli indo pra casa passando pelo vão da cerca de balaústres, com a boca aberta chorando e com as pernas marcadas pelas varadas. Márcia, Lurdinha, Nanai e a Bete saiam de fininho já sabendo que a minha mãe ia pedir pra Suzana ou pra minha irmã, trazer a cinta, porque na cabeça dela, eu tinha que levar uma surra também - isso pra ela não ficar mal com a vizinha. E o pau comia solto até o dia que eu descobri que era melhor eu fugir antes da minha mãe chamar a Suzana ou a minha irmã. Dito e feito - subi no abacateiro feito um gato e lá de cima, só olhando as coisas. Minha mãe ficou furiosa. Tentou me fazer descer sob ameaças e eu nadica de nada, só olhando. Então, ela mandou a Suzana trazer um bambu que era usado pra levantar o varal e tentou me cutucar pra eu descer. Nada feito, eu subi mais alto e como ela era baixinha, não pode fazer nada. Mas o destino estava contra, pois na brincadeira, eu tinha tinha tirado o tênis pra não sujar o tapete da casinha e na fuga, não deu tempo pra calçar, portanto eu estava descalça me equilibrando nos galhos mais altos do abacateiro. Minha mãe desistiu do bambu, mas não largou a cinta e pra meu desespero e dor nos pés, mandou trazer uma cadeira e sentou, olhou pra cima e falou: Vamos ver quanto tempo você vai aguentar ai em cima, porque eu tenho o resto do dia pra esperar. As minhas amigas, já de banho tomado saíram para os respectivos quintais junto com as mães e ficaram assistindo a minha tortura: se eu descesse ia apanhar e ficando lá em cima, os meus pés estavam doendo. Minha mãe, de boa sentada batendo papo com a mãe da Roseli e da Bete, só esperando - de vez em quando dava uma olhada pra cima pra ver com eu estava. Eu, fingindo que não sentia nada, mudava o pé no galho a cada cinco minutos, mas resisti bravamente até as 18h, quando finalmente o meu pai chegou. Minha mãe relatou o acontecido e meu pai mandou trazer outra cadeira e sentou junto com ela e pra meu desespero, ele mostrou o embrulho que tinha na mão - os meus doces! Putz! Todos os dias ele passava na Confeitaria Suga e trazia bomba de chocolate, papos de anjo e banana kasutera, meus doces prediletos! Eu não acreditei quando ele abriu o pacote e serviu os "meus doces" pra Roseli, Bete e os demais observadores da desgraça alheia, inclusive minha mãe, minha irmã e a Suzana comeram os doces. Depois disso, ele falou: Desce! E eu desci até onde aguentei e ele me pegou no colo e me levou pra dentro de casa - dai, longe de todos eu abri o berreiro porque os pés estavam doendo e eu não tinha os doces.Meu pai rezou um sermão de meia hora, mandou eu tomar banho, o que eu fiz - sentada, por conta da dor nos pézinhos. Depois, fomos até a Confeitaria Suga comer uns mil e quinhentos doces - rsrsrsrsrs - e no outro dia, Roseli apanhou de novo, mas não foi com galho de pessegueiro, mas com uma vara de pesca! E o tempo passou entre brigas e choros, até eu vir embora pra Curitiba e nunca mais vi a Roseli. Com as outras amigas mantenho contato até hoje...


Nenhum comentário:

Postar um comentário